segunda-feira, 29 de janeiro de 2007

Clássico dos Clássicos

- Texto previamente publicado na última edição do jornal ESPMiano de maior tiragem em 2006, o Sr. Laranja -
Sou de uma geração que conserva o saudosismo de uma época que não viveu, que admira grandes ícones já mortos, e que ouve as músicas eternizadas pela memória de nossos pais. Enfim, uma geração que queria ter vivido em outra época. Em tempos em que a boa música é uma espécie rara, ameaçada de extinção, resta a nós, jovens saudosistas, lembrar dos discos que quebraram paradigmas e marcaram época. Venho aqui lembrar de um desses discos.

É um clássico. Uma verdadeira obra de arte, assinada não por um, mas por quatro artistas. Sua presença entre os 10 maiores discos de todos os tempos é indiscutível. E se existe alguma lista no mundo que não inclua esse disco, há de ser a lista dos piores. Aliás, se existe alguma lista no mundo que não inclui os Beatles, essa lista é malfeita. Até porque, na última lista dos 10 maiores discos de todos os tempos, publicada pela BBC em agosto, os rapazes de Liverpool apareciam com 4 de seus discos. Daí vem a dúvida: “mas qual disco é esse?” afinal de contas, dizer que um disco deles é genial é, no mínimo, redundante. Os discos falam por si sós. Os Beatles falam por si sós. O Abbey Road fala por si só.

Sim, o Abbey Road. Aquele disco cuja capa mostra os quatro Beatles atravessando a rua, repleto de mitos e indícios da morte de Paul McCartney. Um apanhado de canções geniais, considerado por mim e por muitos, o melhor disco dos Fab Four. O disco no qual os Beatles voltaram às suas raízes, as raízes do bom e velho rock n’roll, e fizeram o melhor lado B da história do vinil. A ode, portanto, é justa e inevitável.
O Abbey Road é o penúltimo disco lançado pelos Beatles, mas o último a ser gravado, depois do Let it Be (uma jóia também). Sua história envolve toda a lenda de que Paul McCartney teria morrido e sido substituído por um sósia, Billy Shears, que é inclusive citado na música “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”. Na capa, há vários indícios da morte de Paul, como por exemplo, o fato de ele ser o único andando descalço, com um cigarro na mão direita (sendo que ele era canhoto), e os demais Beatles representando o médico (John), o Padre (Ringo) e o coveiro (George). Muitos (inclusive Kotler) dizem que foi uma grande estratégia para alavancar a vendas do disco, mas isso é assunto pra outra discussão.

O fato é que o Abbey Road é um disco de retorno às raízes. Já diria George Martin que os Beatles voltariam a tocar como “nos velhos tempos”, ou seja, livres das discussões e brigas que vinham acontecendo (com certa freqüência). E como resultado dessa postura surge este magnífico álbum.

É no Abbey Road que ouvimos a maior contribuição de George Harrison aos Beatles, não só com músicas como Here comes the sun e Something, mas também com pequenas frases de guitarra e vocais afinados. Além de ser o mais legal dos Beatles, George se supera nesse álbum. Ringo também contribui com Octopus’s garden, a segunda música assinada pelo baterista, que narra um passeio pelo fundo do oceano. O impressionante é como essa música realmente lembra o fundo do mar, ainda mais com os vocais em gargarejo na parte do solo.

Mas as demais composições de Paul e John não ficam para trás. Come Together, por exemplo, é genial. A faixa de abertura do Lado A é, basicamente, uma variação de blues com o baixo marcante, solinhos de guitarra fenomenais e letras nonsense, além de um tecladinho inebriante pós-refrão.

Outro exemplo é I want you (she’s so heavy), escrita por Lennon. Trata-se de uma música de poucas palavras e uma das melhores do álbum. É hipnotizante, com um tom mais pesado, que depois se transforma numa longa sucessão de “climas”. A voz acompanha o fraseado da guitarra, percorrendo quase toda a música, que dura cerca de 7 minutos.

Há também baladas românticas, como Oh Darling!, mais ao estilo anos 50, com um piano intermitente, guitarras secas e algumas doses de vocais gritados por Paul (When you told me / You didn't need me anymore...).

Todas as canções merecem sua menção, seja Maxwell’s Silver Hammer, com suas guitarrinhas caipiras e batida circense, Because, com seu tom grave e triste, ou You never give me your money que abre o Medley do Lado B com genialidade.

Aliás, cabe aqui uma descrição precisa do medley do Lado B, por que ele é talvez a seqüência de músicas mais impressionante que já ouvi na vida. As más línguas dizem que esse medley desagrada John Lennon pelo fato de ter sido criado quase que exclusivamente por Paul McCartney, mas eu discordo, já que é impossível não gostar dessa seqüência. De fato, é incrível como as pequenas canções se desenvolvem e se complementam, resultando numa narrativa musical considerada por muitos como o clímax do álbum.

O Medley começa com You never give me your money seguida por Sun King, cantada em italiano, Mean Mr. Mustard (such a mean old man! e Polythene Pam. Em seguida vem She came in through the bathroom window (escrita depois que uma fã literalmente entrou na casa de Paul pela janela), Golden Slumbers e Carry that weight. E para finalizar o medley, nada mais justo que The End, com um solo de bateria de Ringo e ainda um jam de solos de guitarra feitos por Paul, John e George, que levam qualquer um à apoteose.

Depois do medley, Her Majesty, uma pequena vinheta de 20 e poucos segundos com voz e violão, termina o Abbey Road em sol.

E ai eu sempre fico esperando o próximo acorde, com cara de besta, absorto, imaginando: “como é que esse disco foi feito?”.

OBS – Pra quem ficou curioso, veja aqui a lista dos TOP 10 discos de todos os tempos, divulgada em agosto pela BBC.
Download - The Beatles - Abbey Road

Um comentário:

DiegoFerrite disse...

obs: "psico virou fumaça"